domingo, 27 de novembro de 2011

Miguel dos Anjos - Esse Samba todo é Nosso (2007)

Corpulento, voz potente, Miguel dos Anjos já surpreende pela suavidade com que se comporta e canta. A suavidade de ser e cantar é, como se vê logo, uma opção existencial e musical.

Não é por acaso que neste seu primeiro disco, “Esse samba todo é nosso” (Fina Flor), Miguel, de forma até inconsciente, empresta sua suavidade a algumas músicas criadas pelos mestres da suavidade musical. De Mário Reis, o primeiro cantor moderno (porque desprovido de efeitos, com o canto o mais próximo possível da fala cotidiana) do Brasil, quiçá do mundo, Miguel pinçou “Quando o samba acabou”, um Noel Rosa menos festejado do que merecia, samba narrativo, melancólico, belo de doer. De Paulinho da Viola, enfrenta a obra-prima “Coisas do mundo, minha nega”, numa versão originalíssima, guiada por uma batucada delicada conduzida por atabaque e trombone. Curioso que ambas as canções, de Noel e Paulinho, são sambas leves e sincopados que contam histórias secas, pungentes, de se chorar mais para dentro do que com lágrimas. E que, numa outra composição, “Eu canto samba”, Paulinho cita “Quando o samba acabou”, mostrando sua filiação a esse tipo de estética, digamos, suave. Da qual Miguel é seguidor.

Em seu primeiro disco, ao recriar Mário Reis / Noel e Paulinho da Viola, Miguel dos Anjos diz portanto de onde veio, algo muito importante para um artista. Mas além de cantor, compositor, ele também diz de onde veio de forma confessional no samba de feitio clássico que dá nome ao disco, “Esse samba todo é nosso”: “Assim como a água não pertence ao rio / Que leva a chuva para o mar / Quando eu canto sou somente leito pro samba passar”, diz Miguel num verso que Paulinho da Viola seguramente assinaria não apenas pelo que diz mas pelas insuspeitadas metáforas com água.

Continua dizendo de onde vem no samba também próprio que abre o CD, “Bênção em vida”: “Não foi de lá foi daqui / A fonte do raio de luz que iluminou sua canção / Foi por gratidão / Que o velho anjo, tomado de fé, seu samba abençoou”. Que “anjo” é esse? O “Anjo da Velha Guarda”, o clássico contemporâneo de Moacyr Luz e Aldir Blanc recriado por Miguel, verdadeiro hino dos sambistas de hoje, protegidos e inspirados pela Velha Guarda mas com a criatividade apontada para o futuro.

Miguel dos Anjos é mineiro e, desculpem o clichê, discreto. Figura importantíssima na noite de Belo Horizonte, ele criou eventos que entraram para a história da música local, como o “Samba do compositor”, dedicado a autores como Nei Lopes, Hermínio Bello de Carvalho e Walter Alfaiate. Ou o “Samba da madrugada”, roda que acontece aos sábados no bairro Caiçara, tradicional reduto do samba e do choro de BH, que começa às 2h e só termina quando raia o dia. Coisa de malandro que gosta de samba e gosta da noite.

Preço – R$20,00

Faixas
01 - Benção em Vida – Miguel dos Anjos e Mestre Jonas
02 - Anjo da Velha Guarda – Moacyr Luz e Aldir Blanc
03 - Barravento – Ruy Quaresma e Nei Lopes
04 - Esse Samba todo é Nosso – Miguel dos Anjos, Mestre Jonas e Mário Roberto Ferreira
05 - Quando o Samba Acabou – Noel Rosa
06 - A Nível de...- joão Bosco e Aldir blanc
07 - coisa do Mundo, minha Nega – Paulinho da Viola
08 - Canção do Sal – Milton Nascimento
09 - Bem-Vinda Presença – Miguel dos Anjos
10 - Ela Desatinou – Chico Buarque
11 - Olhos Verdes – Vicente Paiva
12 - Samba da madrugada – Ruy Quaresma e Nei Lopes

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